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  • “Chico falava isso, sobre diversão levada a sério e hoje a gente vê isso”

    Entrevista com Roger de Renor, por Nayara Nascimento “Cadê Roger, cadê Roger, cadê Roger, ô?” Vendedor, capoeirista, dançarino, empresário, ator, apresentador de rádio e tevê e produtor cultural. Roger de Renor, teve e tem um papel importante na movimentação da cena cultural pernambucana. São mais de três décadas dedicadas às artes. A história de Roger de Renor se confunde com a trajetória da cultura de Pernambuco e com a cena Manguebeat. Afinal, não tem como falar do Manguebeat sem falar da Soparia. Roger de Renor, dono do bar Soparia, lugar que foi um dos principais redutos do movimento manguebeat, conta como surgiu o bar, sua trajetória e perspectivas sobre o movimento. Nayara: Não tem como falar do Manguebeat sem falar da Soparia que se tornou praticamente uma sede do movimento. Como surgiu a Soparia e quais foram os desdobramentos dessa iniciativa? Roger: Eu brinco que a Soparia foi uma tentativa de viver sem trabalhar, depois eu descobri que viver sem trabalhar dá mais trabalho. Mas a Soparia era como se fosse uma festa na minha casa, eu sempre fui muito bom de festa porque eu conhecia muitas pessoas. Eu trabalhava com disco, era representante de uma gravadora de disco, conheci o pessoal da capoeira, fazia teatro e depois fui para o balé popular. Então quando eu deixei de ser representante de disco, eu sabia que daria certo vender ‘rango’ de madrugada e conciliando com a boemia, com a farra... Recife não tinha loja de conveniência de madrugada, tinha mercado público ou a porta da restauração, mas não era lugar feliz e sim de trabalho. A Soparia surgiu para isso, era uma festa todo dia e eu levava a sério isso, eu tava lá toda noite e cuidava de todos os detalhes menos do caixa (risos). Era um lugar muito aconchegante. No início não tinha músicos, começou com chorinho e depois passou a ter atração de segunda a segunda, exibição de clipes, de filmes, teatro, era um lugar muito diverso, ocupou um espaço de sede do Manguebeat e acolheu a galera na ida e volta dos shows, era um lugar muito livre. Nayara: Chico Science e Nação Zumbi foi uma das principais bandas que se consolidou no Brasil e conquistou um renome através do manguebeat. Quais outras bandas do movimento passaram pela Soparia e que conseguiram ter essa consolidação que a Nação Zumbi teve? Roger: Não digo exatamente que foi por tocar lá. Acho que a gente teve mais proveito do que as bandas. Por exemplo, Mundo livre e Nação Zumbi tocaram lá uma vez. Mestre Ambrósio fez temporada lá, tocou toda quarta durante dois anos, era um evento. O show de Chico e Mundo Livre S/A foi bem no começo da carreira deles. Muitas bandas tocaram lá. Chegou um ponto que teve uma banda, que eu não me lembro qual, chegou pra mim falando que ia tocar no Rec Beat em São Paulo, mas que nunca tinha tocada na Soparia e que queria tocar lá antes pra não chegar lá e ser a única banda que não tocou. Banda Eddie, Matala na Mão, todas as bandas da época e as que também por outros motivos não continuaram, mas se estivessem estariam se transformado também como essas, como o Cavalo do Cão, super importante na cena. Era muita gente do movimento que está aí hoje ou pararam por outros motivos. Nayara: A Soparia se tornou uma sede do movimento, era realmente um local que movimentava a cena. Você considera que hoje ainda é importante ter um lugar como esse funcionando como sede para a movimentação de uma cena musical? Roger: Sim, acho que o lugar físico é imprescindível, por mais que a tecnologia preencha o lugar da rádio, hoje por exemplo tocou uma artista e eu fui procurar ela no Instagram e eu já a conhecia por referência de outros músicos como Lucas Torres. Então hoje a gente tem a referência do algoritmo, mas ele não é honesto com a gente, não que os bares sejam, a gente não confia tanto, mas a confiança na pessoa humana que produz o lugar, o aconchego, o acolhimento para as pessoas irem e se encontrarem. Música é encontro. Tem outros lugares como o Terra Café e o outros que eu considero que são lugares bem importante pra nossa música. Outros institucionais como o Passo do Frevo, que são importantes e construídos também a partir dessa necessidade. Mas os lugares físicos continuam, talvez não como sede, ou inferninhos porque as coisas mudam, mas como espaços humanos de encontros e de assistir ao vivo, e agora com essa necessidade que a gente tem de lugares de pequeno porte, porque a gente tá cansado de palcos grandes que você ver nos telões. Antes da pandemia já tinha lugares pra 40 pessoas, mais acessíveis etc. E isso é massa porque você fideliza a galera e depois consegue multiplicar pelas redes sociais. Nayara: Olhando pros 30 anos do manguebeat, para toda a trajetória da soparia, você faria algo diferente? Roger: Tô respirando pra pensar não, mas pra não chorar. Com essa volta do FIG, se eu parar pra pensar eu me emociono. Eu teria estudado, daria tempo ainda. Mas eu tive uma experiência legal na época que eu fui chamado pra estudar era uma pauta pública que a gente discutia muito, fiz programas de rádio mesmo sem ter me formado, me assumir como comunicador, fiz vários programas de rádio… Essas experiências foram uma formação também, mas talvez com formação acadêmica eu também teria contato com outras pessoas e ia descobrir muitas coisas também, ia ser outro aprendizado. Nayara: O manguebeat surgiu através dos manifestos e críticas sociais, através do que a própria sociedade enfrentava. Você enxerga que o movimento continua com essas mesmas ideias? Roger: Eu não vejo mais o movimento como só musical, acho que a música serviu pra chamar atenção, mas hoje as causas tem mais alcances porque tem mais ferramentas. O Manguebeat sofreu com esse remédio que ele usou pra ter o alcance. A forma de comunicação era a MTV, eu fico meio assim quando vejo as pessoas falando e quase celebrando “ah, MTV tava chegando no brasil” e esquece a crítica sobre isso, a MTV clareou, embranqueceu o Manguebeat. O movimento tem pessoas brancas sim, mas o reflexo dele é negro, é periférico. A gente tem Chão de Estrelas e Peixinhos como a base, e isso se calou, Josué de Castro é um fundamento, por exemplo, mas passou a ser curiosidade. As pessoas dentro da comunidade hoje, que compõe, que faz manifestação, que faz grafitagem, tá ocupando os espaços no CAC, na Universidade Federal, muita gente do teatro, dança etc. Elas têm outra visão, são pessoas do Bode, Ilha de Deus, de Peixinhos... Fui fazer uma pesquisa sobre a galera de Peixinhos porque eu queria citar os nomes aqui e não lembrava de alguns, e eu encontrei várias monografias sobre o movimento lá, as bandas de lá, os lugares de diversão da juventude, muitos projetos acadêmicos e eu fiquei muito feliz com isso, isso é fruto do movimento Manguebeat. Nayara: Em relação aos 30 anos do Manguebeat, o FIG voltando depois da pandemia, o Som na Rural, quais foram suas expectativas e como está sendo vivenciar esses movimentos? Roger: Eu fiquei pensando nisso, desses 30 anos, e eu acho massa, é um planejamento pro futuro. Eu fico muito incomodado se alguém me falar que é uma homenagem. Eu não vejo como uma homenagem, eu vejo realmente como um planejamento pro futuro. Muita gente chega pra tirar foto comigo, a gente bate um papo muito de boa, é uma galera de 23, 24, 25 anos, não tem papo de que “poxa, meus pais te conheciam” não, geralmente os pais são mais caretas, quando eles estão juntos eu até brinco e tal. Enfim, eu tenho pirado com uma galera que é apaixonante, Barbarize e outras bandas novas. Ontem tava Joyce Alane tocando aqui um som muito foda e é música muito profissional, muito requintada e é uma galera jovem que consegue isso de uma forma muito séria, diversão levada a sério. Chico falava isso, sobre diversão levada a sério e hoje a gente vê isso. Então eu quero acompanhar esse planejamento futuro dessa turma, eu quero tá por perto, eu tô sempre querendo começar de novo, acho muito legal a gente sempre tá inventando coisa nova. Eu dependo da galera, de vocês, dos novos.

  • Matéria-documento e efeito sensorial na arte contemporânea e no cinema de Renata Pinheiro

    Falar da obra de Renata Pinheiro abrange um legado como diretora de arte, realizadora audiovisual e artista visual. A pesquisa ‘Matéria-documento e efeito sensorial na arte contemporânea e no cinema de Renata Pinheiro’, realizada por Iomana Rocha e Tainá Xavier, apresenta uma interessante análise do trabalho da artista pernambucana. As obras analisadas apontam para questões que envolvem o cinema e a arte contemporânea. Indicam memórias, afetos e possíveis leituras dos espaços e objetos a partir de estratégias imersivas que colocam o espectador em um devir instalação. Publicada pela Revista Graphos, idealizada pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal da Paraíba, a pesquisa pode ser acessada no link abaixo: Matéria-documento e efeito sensorial na arte contemporânea e no cinema de Renata Pinheiro

  • Peixe, Homem e Câmera em ação. Silêncio

    Maryane Martins Ambiguidade. Corpo. Educação. Raça. Instinto. Etnografia. Linguagem. Antropologia. Identidade. Essas são algumas palavras que norteiam o trabalho do artista Jonathas de Andrade. Nascido em 1982, em Macéio, ele vive e trabalha em Recife, onde se formou em Comunicação Social. Jonathas utiliza suportes variados: instalação, cinema e fotografia. Todos eles têm um ponto em comum: um forte conteúdo político e social, em especial, no contexto latino-americano. Ficção, representação e realidade se misturam nas obras do alagoano, que sempre se interessou pela linguagem (do corpo, da palavra, imagética) como expressão. As pessoas e suas relações, sobretudo de poder e classe, estão presentes e norteiam boa parte da produção do artista. Afetos que passeiam pela crítica histórica, pelo erotismo, nostalgia e na identidade do sujeito, que nos trabalhos de Jonathas, é quase sempre representado pelo corpo masculino. Um dos trabalhos que refletem este último é “O peixe”, um filme cujo enredo poderia ser definido na frase “Homens seminus abraçando peixes”. Mas, é muito mais que isso. Raízes do mangue e o Rio São Francisco. É no encontro com o mar, entre Alagoas e Sergipe que, por trás da câmera em 16mm, Jonathas de Andrade, nos leva ao ambiente de “O peixe”. A câmera em tons terrosos do diretor, passeia apresentando o espaço e leva o espectador a uma sequência de cenas, em loop. Há um pescador para cada uma delas. Em seus trajes de banho, esses homens guiam suas canoas por entre os mangues, em busca de peixes. Ao invés de matar os animais no momento da captura, os pescadores os confortam, enquanto os peixes morrem lentamente em seus braços. O diretor expõe as imagens sem interferências: não há textos na tela, entrevistas ou diálogos. O som é a vida e a morte, acontecendo juntas, ali. “O peixe traz um abraço limite.” Um rito de passagem. O homem e o peixe estão em condições de espécie. Presa e predador. É uma relação de dominação. Jonathas traz essa relação de forma contrastada, cheia de ambiguidades. Há uma morte assistida, há afeto, solidariedade e, violência. O diretor faz uma produção etnográfica documental-ficcional. Documental, pois as cenas foram reais, com pessoas reais. Ficcional porque a situação foi dirigida por ele, não espontânea. Os pescadores cumprem o papel de serem eles mesmos, mas são colocados em uma situação não habitual: de maneira oposta a pegar o peixe e jogá-lo no barco, onde ele se debate até a morte, em “O peixe” essa morte é sentida de perto, acalentada. O pescador pega o animal, o abraça, dá carinho, o sente até o último suspiro. Quando o abraço acontece, o homem percebe o peixe. Aquela morte deixa de ser banal. Há um sentimento diferente ali. Há uma espécie de respeito. Há uma intimidade. Mas, paralelo a isso, há o uso da força, do poder, da dominação. É quase como uma relação da inevitabilidade da força de um sobre o outro. Por isso, a ambiguidade: vida e morte. Para o espectador, os sentimentos de inquietação, incômodo. É uma produção silenciosa, a imagem, os olhares do peixe, do homem, são carregados de emoção. Há uma relação física, simbólica e, em alguns momentos, quase que erótica entre homem e a natureza. A câmera não foca no momento da pesca, o enquadramento é o toque que eleva o filme, ele nos leva a outro olhar: o de Jonathas. A câmera, quase que desaparece. E quem assiste mergulha naquele ambiente. A imagem é utilizada como vetor de discurso e confronta quem assiste de forma direta e próxima, trazendo um contato profundo com a visão do autor. Além disso, há a relação direta do pescador com a câmera. Alguns vivem aquela situação não-comum, dirigida, com muita naturalidade. Outros, apresentam claro desconforto com a presença do equipamento. “O peixe” pode ser visto como uma conexão com a natureza, por meio do encontro, da resposta dos corpos que, de forma espontânea respondem a presença um do outro. Se percebem. Há uma subversão no ato de pescar, na banalização da morte daquele animal. Mas, ao mesmo tempo, não deixa de ser uma relação de violência, crueldade. O encontro com a carne. Os olhares que denunciam. “O peixe” é um silêncio que fala.

  • Sangue vermelho, gasolina azul

    Leandro Ferreira¹ Na cidade de Caruaru, o avanço da automação encontra refúgio na figura dos automóveis. É na estrutura das suas carcaças metálicas, consideradas extensões artificiais do corpo, que figuram os confrontos entre natureza humana e tecnologia. O recém-estreado “Carro Rei” retrata com destreza os conflitos entre humanos de sangue vermelho e carros movidos por gasolina azul, em uma fábula na qual o antropomorfismo se debruça a figura dos carros, e os criadores e suas criações se demonstram essencialmente indissociáveis em suas semelhanças e disparidades. O maior município do agreste pernambucano perpassa a visão dos espectadores através de um filtro pincelado por pigmentos azuis, amarelos e verdes, seu aspecto cristalizado antecipa a intervenção da máquina nas projeções da realidade. Subliminarmente, a presença dos signos pátrios explicita a distopia e a contextualiza aos olhares, promovendo a naturalização dos absurdos ao acostumar gradualmente a visão à banalização das incoerências experienciadas. Atravessando a sua atmosfera e conduzindo a existência a um estado de simulacro de si própria, a visão estrábica da princesinha do agreste, dividida entre as potências da natureza e o pulsar das máquinas e motores, remete às suas próprias dessemelhanças, que ao se manifestarem em seus habitantes, tomam proporções inesperadas. Sob o farol de uma nova aurora, entre os sons das buzinas e o tilintar dos sinos que denunciam a presença animal, o nascimento de Uno (Luciano Pedro Jr.) nos insere nas ânsias de uma nova geração, concebida conjuntamente aos rápidos avanços científicos, mas permeada por preocupações relacionadas às questões sociais que povoam o inconsciente dos que promovem as possibilidades de revolucionar o mundo. Inserido em um núcleo familiar estritamente masculino, e cujas relações de poder se materializam através das proporções aerodinâmicas de caráter fálico que se materializam através dos carros, Uno é dotado da habilidade ímpar de se comunicar com essas máquinas que perpetuam a existência do negócio familiar de seu pai (Adélio Lima), responsável pelo seu sustento e de seus parentes, tal qual o seu tio e mecânico, Zé Macaco (Matheus Nachtergaele). O trânsito inconstante do filme em frente às temáticas que circundam esses personagens nos apresenta um leque de possibilidades, vivências e vazões que nem sempre são contemplados pelo rápido ritmo da narrativa encenada. Tendo desdobramentos não comportados dentro da duração longa, encerrando assim a curiosidade que atiça ao inserir o público nas vicissitudes de seus agentes. Cercados pelas interações masculinistas, os automóveis adquirem um aspecto de virilização, fundamental na relação de domínio imposta através das disparidades dos gêneros. É atribuída aos homens a capacidade de alterar a vigência das leis que interditam a circulação das velhas carcaças dos carros que já atingiram idade similar a puberdade, assim como são homens que tomam a direção e ditam as marchas e caminho percorridos pelos carros, exercendo o controle sob as ferramentas que elevam a posição da humanidade enquanto liderança na corrida da adaptação e sobrevivência, atropelando outras espécies no seu entorno. Reestruturados para proporcionar continuidade ao trânsito desenfreado através das avenidas do pseudo progresso, esses veículos se dimensionam enquanto partículas de uma inteligência outra, similar a de seus criadores. Dotados de senciência, se configura no cerne de seus pensamentos, uma revolta iminente contra parte do sistema que os impõe o estado de subalternizados, mas que não reverbera nas pessoas responsáveis pelas decisões que os relega a esse espaço. Esse esforço vão, exercício da revolta indiscriminada, se direciona à pessoa mais próxima das contradições que resvalam a condição humana e a máquina, representada na figura da feminilidade de Amora (Clara Pinheiro), é possível notar nesse embate um conflito de gênero implícito, na qual a convivência harmônica figura enquanto impossibilidade, e somente a subversão do outro se faz possível. Os homens, que anteriormente domavam as toneladas de metal retorcido que proporcionam forma às relações de poder, retornam gradualmente aos seus aspectos mais atávicos, passando a ocupar um espaço secundário na pirâmide de predominância. Dispostos à situação de servidores dos carros, passam a atender os interesses frutos de seus próprios desvios morais, facilmente manipuláveis pela ganância do lucro imediatista e recompensas que duram menos que seus corpos. “Carro Rei” é uma obra composta por binômios díspares e suas interações, os empasses entre velho e jovem, tecnologia e natureza, homem e mulher, cujos simbolismos se fazem explícitos de maneira didática para seus observadores, norteiam a polarização de um contexto no qual se dividem os antônimos sem possibilidade de conciliação. A direção de Renata Pinheiro orquestra alegorias que se dimensionam para além dos limites geográficos de Caruaru, e ecoam no panorama do Brasil contemporâneo. É no cerne desse país, liderado por homens, cujas similaridades estão mais dispostas aos símios, que se conservam estruturas de dominação da natureza, da tecnologia e dos corpos. Através de discursos animalescos, cujas características se demonstram tão primitivas quanto seus valores primatas, a subversão das subjetividades humanas dá vazão à valorização dos meios mecânicos, objetivos. ¹ Leandro Ferreira é graduando do curso de Design pela UFPE/CAA e faz parte da equipe da Revista Spia.

  • FIG 2022: Para matar a saudade e esquentar o coração

    A cidade de Garanhuns, no interior de Pernambuco, abre suas portas para a 30º edição do Festival de Inverno Johany Medeiros¹ Desde a sua primeira edição, em 1991, o Festival de Inverno de Garanhuns - FIG pretende valorizar as mais diferentes linguagens artísticas do estado e do Brasil. Após dois anos sem festa, devido a pandemia de covid-19, o festival volta com toda a sua magia e sua imensa variedade cultural. Por 29 edições, o FIG se fez presente na vida e na memória do povo e, em sua 30º edição, é preciso compreender o seu significado em resistência dessa pluralidade artística aqui no estado e esse ano não poderia ser diferente, e não poderíamos ficar de fora: é hora de matar a saudade, espantar o frio e esquentar o coração - nem que seja só um tiquinho. Se for pra ser, deixar fluir No último final de semana, a cidade de Garanhuns (PE) foi palco e ponto de encontro para diferentes artistas do estado e do país. Desde o dia 15 de julho a cidade celebra mais uma edição do Festival de Inverno, a primeira depois de dois anos parado por causa da pandemia do Covid-19. O palco Som na Rural foi sucesso garantido e conseguiu trazer consigo toda a potência, magia e arte que exala do nosso estado. A sexta-feira (22/07) nos presenteou uma com uma noite para lá de especial, que nos fez lembrar que “se for pra ser, deixar fluir”, da forma que canta Isadora Melo e nos fez entender que “é no presente onde moro então eu aproveito”, da maneira que entoa Marcelo Rangel. Além destes, houve participação dos artistas Lucas Torres e Joyce Alane. A grade oficial do palco Som na Rural, na 30º edição do FIG, segue com demais atrações até o domingo (30/07). Arte para aquecer o corpo e o coração O segundo dia da nossa cobertura, sábado (23/07) foi repleto de arte. Assim que colocou os pés na cidade, nossa repórter Sammy deu de cara com o grupo Maracatu Estrela Brilhante, de Igarassu. Fundada por Cosme Damião Tavares, em 1906, é a nação em atividade mais antiga aqui no estado de Pernambuco e comemora seus 112 anos de pura cultura, com seu batuque contagiante e inigualável. Para Sammy, presenciar a apresentação foi uma experiência muito arrebatadora e bem emocionante. “A dança junto com as batidas da música são elementos que se encaixam perfeitamente. Eu posso dizer, dá para sentir o espírito do maracatu”, diz Sammy. Continuando com o nosso itinerário, seguimos para o Cinema do Sesc, onde ocorreu o 2º Seminário Arte Contemporânea em Perspectiva, que nesta edição tem como temática “Arte e Política" e tem como objetivo trazer reflexões sobre o atual cenário brasileiro na arte. Os convidados da mesa Criação e Política foram: Juliana Notari (artista visual), Hilton Lacerda (cineasta) e Manoel Constantino (jornalista, escritor, ator e diretor de teatro). Juliana Notari, doutora e mestre em Artes Visuais, trabalha com as mais diversas formas de linguagens e acredita que a arte em si já é política por natureza. Para a artista visual, “a arte lida com emoções, a arte lida com sentimentos, ela provoca o nosso modo de estar no mundo, de sentir, de perceber, de amar, de desejar”. Para Notari, a arte gera sensibilidade e empatia e conclui “a arte é muito poderosa, porque ela consegue atravessar isso e criar seres empáticos, seres sensíveis, que é isso que estamos precisando”. O cineasta Hilton Lacerda, além de carregar uma bagagem cinematográfica imensa, como os filmes Amarelo Manga (2003) e Baixio das Bestas (2006), também é o responsável pela direção de vários videoclipes da cena do Manguebeat aqui no estado e diz que o que mais o interessa no movimento mangue “foi uma cidade se descobrir capaz de produzir e pensar arte e cultura, foi uma mudança muito drástica no comportamento de uma cidade”. Agora no hall da entrada do Sesc, uma exposição intitulada Sete Luas de Sangue. Em homenagem à pintora Tereza Costa Rêgo, que faleceu em 2020, aos 91 anos de idade, estão em exposição um conjunto de sete obras dela. Tereza, que tem como traço forte em sua pintura os tons locais e de insolações tropicais, onde suas obras carregam os tons vermelhos e, logo em seguida, uma nudez feminina que busca romper com os discursos predominantes masculinos dentro da pintura moderna de Pernambuco. Prestigiar as obras de Tereza é entender e sentir a libertação feminina que domina o próprio corpo e tem seu prazer conquistado, longe de qualquer submissão. Para finalizar o corrido e maravilhoso sábado, nada melhor que se esquentar um pouco no calor humano. A equipe, dividida entre os dois palcos, conseguiu curtir o show do Palco Som na Rural, que contou com presenças como a das cantoras Luana Tavares e Larissa Lisboa. No Palco Pop, conseguimos registrar o maravilhoso show da banda de São José do Egito, Em Canto e Poesia. Talvez tenha sido um final de semana curto, para tantos dias desse evento grandioso, mas o que resta são ótimas memórias, saudade, aperto no peito e um até logo. Nunca uma despedida. * A Exposição Sete Luas de Sangue ficará disponível até o final do festival. ¹ Johany Medeiros é graduanda de Comunicação Social pela UFPE e faz parte da equipe da Revista Spia.

  • A resistência de Gonzaga

    Gonzaga de Garanhuns, mestre de reisado, poeta e cordelista, dedica sua vida a paixão pela cultura popular de Pernambuco Sammy¹ O enlace de Luiz Gonzaga de Lima com a cultura popular pernambucana é longo. Teve início no ano de 1954, no Sítio Sussuarana, zona rural de Garanhuns, quando aos 12 anos de idade teve o primeiro contato com o Reisado -folguedo popular tradicional do Agreste pernambucano. Conterrâneo de grandes artistas, como Mestre Dominguinhos, Seu Gonzaga de Garanhuns, como é popularmente conhecido, resiste às passagens do tempo, sendo um personagem intrínseco à história da cidade de Garanhuns. Nomeado patrimônio vivo de Pernambuco, em 2018, pela Secretaria Estadual de Cultura juntamente a Fundação de Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe), Gonzaga de Garanhuns dedicou sua vida a arte, seja no reisado, na poesia, na música ou nos cordéis. Além do Reisado, Seu Gonzaga, o escritor e cordelista, publicou seu primeiro trabalho de cordel em 1973, chamado “Lampião e Serrinha''. Desde então acumula mais de 300 títulos autorais, que ultrapassam as fronteiras do Nordeste e conquistam o mundo afora. Suas obras estiveram expostas em diversos países, como os Estados Unidos, França e Japão. Para manter seu legado vivo, junto de seu filho, Seu Gonzaga inaugurou em 2021 o Espaço Cultural Gonzaga de Garanhuns dedicado ao ensino a folia do Reisado, acervo fotográfico, exposição dos cordéis autorais e bodega de bebidas artesanais, além de uma viagem no tempo com a história do transporte municipal de Garanhuns em formato de miniaturas. Mestre Gonzaga é um homem autêntico, simples e caloroso. Entusiasmado por sua própria cultura, é uma das principais figuras na manutenção da tradição da cultura popular de Pernambuco. Marcou presença no Festival de Inverno de Garanhuns (FIG), localizado, precisamente, no polo dedicado à cultura popular, Seu Gonzaga conversou com a Spia acerca de seu trabalho e a volta aos palcos com o retorno do festival. Como é estar de volta ao festival de inverno de Garanhuns (FIG) após dois anos de pandemia? Foi a maior benção que Deus nos deu, eu tenho muita alegria em estar de volta junto com meu povo no festival de inverno, depois dessa pandemia terrível que prejudicou tanta gente. É muito bom estar de volta, me sinto muito grato. Qual a importância do festival para a valorização da cultura popular pernambucana, sobretudo a cultura do reisado? Olhe, eu vou lhe dizer uma coisa, esse festival valoriza muito a cultura do nosso Pernambuco, é uma coisa linda de se ver. É um empenho muito grande, por isso nós estamos aqui hoje nessa apresentação, para valorizar nossa cultura popular tão rica. Dedicar um palco somente a cultura popular mostra o quanto o festival nos valoriza. O senhor é um dos grandes nomes da literatura de cordel da região. Como surgiu o interesse e de que forma o cordel passou a fazer parte da sua vida? Entrou na minha vida através de um artigo de jornal. Eu lendo um artigo do Diário de Pernambuco, vi que uma cidade estava sendo elogiada pela literatura de cordel e Garanhuns não tinha isso, e pensei: Garanhuns agora vai ter literatura de cordel. Isso já faz 50 anos, há 50 anos que o cordel está na minha vida. Durante a pandemia, foi inaugurado um espaço cultural dedicado a suas obras, quais são as expectativas para o espaço com o afrouxamento da pandemia? Eu tenho muita expectativa, é um espaço para a propagação da nossa cultura, mais um espaço na cidade. Tenho expectativa de receber todos lá. Depois de tantos anos de luta em defesa da cultura popular em Garanhuns, o senhor foi declarado patrimônio vivo de Pernambuco, qual o seu sentimento ao receber essa nomeação? Foi incrível, é um sentimento que não sei descrever. Foi uma grande felicidade e uma grande surpresa! Eu já vinha há mais de nove anos lutando por esse título. Em 2018, graças a Deus, reconheceram meu esforço e dois reisados, além do meu, foram declarados como patrimônio de Pernambuco. É uma honra carregar esse título. E na sua visão, qual o futuro do reisado? O senhor enxerga as novas gerações mantendo essa cultura viva? O que fazer para despertar o interesse dos mais novos pela cultura popular? É preciso de muito esforço para que o reisado continue vivo. É uma cultura que vem sendo esquecida, sobretudo pelos jovens, pelas gerações mais novas. Mas mesmo assim, estamos fazendo o que podemos. Levamos essa cultura para as escolas, as escolas têm colaborado com esse projeto. Nesse semestre, já vou apresentar um reisado em uma escola na rua da liberdade, próxima ao Espaço Cultural. Eu acredito que a educação é um caminho firme, já que a cultura tem sido tão desvalorizada no nosso país. ¹Sammy é graduanda do curso de Comunicação Social pela UFPE/CAA e colaboradora da SPIA.

  • O Pontapé do Baile Perfumado

    Tendo como elementos estéticos e narrativos funções metalinguísticas que trabalham o cinema e a política à realidades em diversas épocas do país, o filme Baile Perfumado (1996), de Lírio Ferreira e Paulo Caldas, recria acontecimentos históricos ao mesmo tempo que nos conta de um homem que quer mudar o mundo. Este homem é Benjamin Abrahão e ele foi o responsável pelas imagens históricas do bando de Lampião Nossa colaboradora, Luzia Tôrres (@luziamtorres), é autora dessa análise fílmica da obra que tornou-se pontapé para outros filmes aqui no estado e apresenta um pouco do próprio cinema pernambucano nesse vídeo-ensaio. Assista o vídeo aqui na íntegra: Sinopse: O filme Baile Perfumado possui uma metalinguística que trabalha o cinema e a política, costurando toda sua história à realidade do cenário cinematográfico em diversas épocas do país. E recria acontecimentos de modo que a arte possa-os adornar ao mesmo tempo em que nos conta a história de um homem com aspirações de mudar o mundo. Nesse vídeo-ensaio, é feita uma análise do filme dentro de sua narrativa e contexto de lançamento, apresentando também um pouquinho do próprio cinema pernambucano.

  • FENEARTE 2022: Um panorama

    Leandro Ferreira¹ A 22ª edição da Fenearte reúne artistas das mais diversas localidades do Brasil e expõe suas obras em uma plataforma de divulgação de proporções ímpares, tensionando a linha tênue das concepções que tendem a diferenciar arte e artesanato, o evento apresenta provocações que se debruçam sobre a criatividade de pessoas plurais, atravessadas pelos desdobramentos de suas próprias cartografias e ensejos. Homenageado na escolha temática do evento, o movimento manguebeat está representado na totalidade das concepções estéticas que se teatralizam desde os portões de entrada. Em seus recém-completados 30 anos, é possível afirmar que o manguebeat se remonta na figura de um adulto que atua enquanto inspiração essencial aos jovens movimentos que buscam penetrar o panorama cultural pernambucano. Transitando entre caranguejos, detritos originários dos manguezais e grandes paredes de texto que didaticamente aclimatam o ambiente em uma atmosfera de mangue, o público é a todo tempo lembrado dos signos que povoam o imaginário relativo ao manguebeat. Em uma festa de aniversário cuja temática é o próprio aniversariante, a celebração às possibilidades que manifestam-se através do mangue norteia os olhares mais incautos às narrativas que formatam seus conceitos estéticos. Recebidos logo na entrada por um grande corredor cujas paredes são construídas através dos estandes que expõem peças essencialmente pernambucanos, é possível notar no artefatos reunidas, o contexto de artistas em suas diversas linguagens, se estendendo sobre o escopo da escultura, do bordado, da pintura, e a tapeçaria, dentre diversas outras incontáveis expressões da produção criativa. Se concebe nesse entorno um festim destinado a visão, incontestável aliada das experiências dos transeuntes que transitam pelo ambiente labiríntico das ruas construídas no Centro de Convenções. Nesse cenário repleto de estímulos sensoriais e enredos que se desembaraçam por entre as passagens do local, os visitantes assumem o papel de Teseu ao caminhar despretensiosamente pelos caminhos traçados pelas estruturas do espaço, explorando intuitivamente o que lhes apetece aos seus sentidos e descobrindo possibilidades outras de interesses. A presença dos folguedos tradicionais proporcionam a tônica musical da celebração, estão dispostos os ritmos que inspiraram a musicalidade do manguebeat. Entre maracatus, afoxés e blocos líricos, figuram espetáculos à parte, expressões da cultura popular cujas particularidades carnavalizam as interações com as pessoas ao seu redor. Enquanto isso, a atenção do público se divide entre os sabores dispostos na praça de alimentação, e os festejos se dimensionam enquanto sinestésicos: visão, olfato, tato e paladar operam em consonância para a formatação do deleite dionisíaco. A moda adquire o caráter de partícipe da festividade a partir das passarelas, o desfile intitulado “Inconsciente Coletivo”, realizado no dia 15/07, organizado pelo LabModa, integrante da UFPE, localizado no Campus Acadêmico Agreste, reverbera a ousadia do manguebeat ao introduzir peças e composições que buscam referências nas origens do movimento. Abrindo alas com a música “Monólogo ao pé do ouvido”, de Chico Science e Nação Zumbi, a coleção apresentada não deixa qualquer sombra de dúvida sobre seus intentos, modernizar o passado pode ser também uma evolução que concerne à moda. Modelos que calçam luvas em formato de garras de caranguejo e adornadas por modelagens descoladas ao corpo transitam por cima das passarelas em passos suaves, mesmerizando uma audiência cujos olhos permanecem vidrados em suas roupas, exceto quando os direcionam aos registros que cristalizam esse momento. Utilizando-se de uma linguagem pautada nas cores sóbrias, o primeiro ato do desfile pavimenta seu caminho com referências ao animal que encabeça o movimento do mangue, é a partir dessas composições que a modelo adquire uma relação totêmica. As referências às letras das músicas entoadas por Chico Science também estão dispostas aqui, tal qual as problemáticas que circundam o entorno do instante que origina o movimento, perpetuadas na cronologia do tempo, na contemporaneidade. O segundo momento da apresentação é marcada pela introdução às referências que tangenciam as tradições populares e os ritmos que são desdobrados nos arranjos do manguebeat. Enquanto o branco atual de plano de fundo para a franja vermelhas da blusa que veste a modelo, e remete aos caboclos de lança, símbolos máximos do maracatu rural, a tipografia ousada que grava a palavra “anamauê” nas pernas da sua calça intuem a adição da lírica improvisada por Chico Science em “Maracatu Atômico”. O resultado dessa ordenação gradual não poderia resultar se não em uma modernização da estética do mangue, representativa de uma tropicalidade estritamente pernambucana. Figuram nessa sessão, o emprego de adereços compostos por miçangas de origens naturais, assim como as cores dinâmicas e brilhantes, como laranja e amarelo remontam os aspectos formais e tonais dos crustáceos adotados enquanto signos do manguebeat. Os looks despojados atingem sua potencialidade máxima e estabelecem com firmeza paralelos facilmente reconhecíveis. A atual edição da Fenearte continua suas atividades até o dia 17/07, sendo indispensável a visita aos que desejam cultivar a percepção atenta aos novos sentidos proporcionados por intermédio das diferentes linguagens presentes em seu contexto, assim como ampliar suas perspectivas sobre as artes, ou, apenas se lançar em festa. ¹ Leandro Ferreira é graduando do curso de Design pela UFPE/CAA e faz parte da equipe da Revista Spia.

  • Santa Puta: O feminino marginal no cinema de Cláudio Assis

    Sobre sexo e violência como narrativas fundamentais da construção das mulheres na trilogia do diretor Thâmara Amorim¹ A menina, guiada pelo pai/avó, sobe em uma pequena elevação da calçada, onde encontra-se, no negrume da noite, um ponto de luz, tal qual um holofote. Sob a impenitência do espaço isolado, o criador despe e posiciona a criatura, submissa e mecânica, para, depois, sentar-se ao seu lado, só um pouco afastado, como se expusesse ao público sua obra de arte. Expande-se o quadro e contemplamos a audiência — de pronto, o espetáculo torna-se ainda mais onírico, obtém caráter religioso, de maneira que avistamos, uma santa nua, em cima do altar, observada pelos seus devotos fiéis. A câmera, então, foca somente em um dos espectadores, o único que não parece ser mero observador passivo, para terminar na imagem altiva e, um tanto longínqua, de um cruz. Ora, Auxiliadora, nome da criança desnuda, é, de fato, uma das denominações da Virgem Maria. A cena descrita acima é a apresentação do núcleo protagonista do controverso Baixio das Bestas (2007), longa-metragem dirigido por Cláudio Assis. No filme, Auxiliadora (Mariah Teixeira), uma adolescente de 16 anos, é explorada sexualmente por Heitor (Fernando Teixeira), seu avô e, segundo rumores, pai, que a exibe sem roupas para os homens da Zona da Mata pernambucana, remota região canavieira. O público – ou assembleia – do número de tão grotesco dueto (a menina e o parente desempenham papéis correlatos na atração aberrante) é formado, sobretudo, por pessoas pobres da área: trabalhadores braçais do canavial, bóias frias e caminhoneiros. Contudo, o espectador que nos é mostrado em primeiro plano, Cícero (Caio Blat), trata-se de um jovem da classe média, que estuda na capital e passa grande parte de seu tempo de tela deitado, e emburrado, no sofá da casa da mãe. O mesmo, no entanto, sente-se confortável em Baixio, porque é lá que seus privilégios de classe atuam com mais força, e, assim, pode presenciar e tomar parte da exploração dos que lhe estão à margem. Logo, duas dicotomias marcam a obra: a oposição entre o interior e a cidade grande — atraso e/ou progresso, bem como o paradoxo da mulher que é, ao mesmo tempo, santa e puta — essa última dualidade faz-se presente, de modo similar, em Amarelo Manga (2002) e Febre do Rato (2011), os dois outros filmes do diretor. No primeiro, longa de estreia de Assis, Lígia (Leona Cavalli), dona do Bar Avenida (único lugar onde aparece), é uma mulher cínica e frustrada, sempre reagindo vigorosamente ao constante e diário assédio que a exaure e exaspera. Quando inicia-se a película, que se passa em um único dia, a personagem olha diretamente para a câmera e desabafa, não sem certa desfaçatez: “(...) E eu… não tenho encontrado alguém que me mereça. Só se ama errado. Eu quero é que todo mundo vá tomar no cu”. Com efeito, todos os homens frequentadores do bar a veneram, mas sabem que ela não concede abertura a ninguém. Em contrapartida, Kika (Dira Paes) é uma esposa exemplar, símbolo do recato evangélico e da obediência cristã: o marido, Wellington (Chico Díaz), açougueiro com fama de canibalismo e brutalidade, a adora religiosamente, não obstante a traia com uma figura que lhe é, à primeira vista, completamente antagônica. Em seu célebre livro From Reverence to Rape (2016), Molly Haskell explora a distinção narrativa da boa e da má mulher no cinema hollywoodiano posterior a Depressão, parâmetro, ainda, relevante: (...) A virgem era uma figura positiva e primária, honrada e exaltada para além de qualquer mérito que possuísse (...) já a “puta” (...) era publicamente castigada e rechaçada — mas, privadamente, era ela a procurada pelos homens. (HASKELL, 2016, p.16, tradução nossa.) De fato, Wellington chega a admitir que sua adorada companheira não tem o desempenho sexual que ele gostaria, uma desculpa para a traição. A personagem, então, parece, em termos woolfianos, corresponder ao perfeito “Anjo do Lar”; enquanto Lígia traduz a decadência desse ideal. Ambas, contudo, são expostas em atos de pressuposta rebeldia: ao ser provocada por um cliente, Lígia levanta o vestido e exibe a vagina, na frente de todos, que nada podem fazer, senão olhar; já Kika encontra-se com o próprio Cláudio Assis, que a interpela na rua e diz: “O pudor é a forma mais inteligente de perversão”. Tal fala do diretor/ator serve como prenúncio de sua revolta no fim do filme. Similarmente aos tipos citados acima, Eneida (Nanda Costa), uma das protagonistas de Febre do Rato (2011), é a musa inalcançável do poeta Zizo (Irandhir Santos) — desse modo, ela também carrega o status de sacralidade e reverência que possuem Auxiliadora, Lígia e Kika. Em uma espécie de sarau na casa de Zizo, o artista pergunta a jovem se ela gostaria de fazer sexo com ele, ao que Eneida responde negativamente: de pronto, ela entra para a categoria romanesca das relações impossíveis. E, na contemplação do desespero do poeta, um de seus amigos reflete: “É, nego…quando a gente leva um ‘não’, a cabeça do pau fica dizendo ‘sim’”. A partir dessa fala, percebe-se que sua inacessibilidade de deusa inspiradora encontra-se, na verdade, em constante corda bamba — Zizo e Eneida iniciam um relacionamento complexo, entre a amizade e o flerte, que tem seus limites sempre transpostos pelo poeta: “Só tô querendo entender porque você insiste em não ficar comigo.” Em uma das cenas de maior tensão, quando os personagens estão sozinhos em um barco, durante uma festa junina, Zizo ameaça estuprar Eneida, que enrijece o corpo em alerta e reage corajosamente: “Tu acha que eu tenho medo de tu, é? Conhecesse alguém que tem medo de tu?” Ao que ele responde, em uma indicação de sua resolução obsessiva de conseguir o que deseja: “Conheço. Eu mesmo.” Em seguida, porém, ameniza a situação: “Não vou fazer nada contigo, tu sabe” — garantia bastante vã, depois da intimidação feita. De qualquer modo, Eneida lhe concede um desejo, mas tal concessão, após a insinuação de violência, torna a cena bastante vaga — a jovem age, ou não, por completa vontade própria? Na contemporaneidade, nossa ideia comum de musa é o retrato de uma mulher, que serve, somente, para a inspiração artística e intelectual de um homem. Em si mesma, contudo, ela é apenas um objeto passivo, talhado e refletido pelas mãos do artista. Seu tratamento de divindade é, pois, instável. Voltemos, então, a Baixio das Bestas: a estática Auxiliadora é tida como virgem pelos seus fiéis, uma característica que, verdade ou não, aumenta o desejo dos homens que a veneram. Com Heitor como “proteção”, ela não chega a ser tocada pelos audientes, mas Cícero não se conforma com seu afastamento dos que a observam — diferentemente dos outros, ele não acredita em sua virgindade e não é saciado, portanto, pelo voyeurismo da mera exposição da nudez da menina — por conseguinte, ele a estupra, momento que a condena, de vez, à prostituição. Estas personagens femininas estão, logo, sempre à beira da zona. Auxiliadora, calada e maquinal, é controlada, desde cedo, pelas vontades do avó/pai, e, por isso, quase não diz nada durante o longa. Somente no final, quando foge de casa e se estabelece em um bordel, a adolescente fala com maior frequência — tal abertura apresenta uma emancipação nada emancipatória: Auxiliadora, quando foge de seu dominador-indivíduo, não escapa de seu dominador institucional, o patriarcado. É curioso, inclusive, como a não-conformação dessas mulheres, sempre acaba em, pelo menos, relativa conformidade, uma vez que, de modo similar, todas cedem às fantasias sexuais de um e de outro, bem como as dos que assistem aos longas: conforme Laura Mulvey, em seu clássico artigo Prazeres Visuais e Cinema Narrativo (1983), no contexto fílmico, há um mecanismo voyeur, que dá-se por meio da saciação erótica proporcionada pela imagem na tela: (...) em sua totalidade, o cinema dominante e as convenções nas quais ele se desenvolveu sugerem um mundo hermeticamente fechado que se desenrola magicamente, indiferente à presença de uma platéia produzindo para os espectadores um sentido de separação, jogando com suas fantasias voyeuristas. (...) Embora o filme esteja realmente sendo mostrado, esteja lá para ser visto, as condições de projeção e as convenções narrativas vão dar ao espectador a ilusão de um rápido espionar num mundo privado. Entre outras coisas, a posição dos espectadores no cinema é ostensivamente caracterizada pela repressão do seu exibicionismo e a projeção no ator, do desejo reprimido. (MULVEY, 1983, p.441) Tal imagem na tela é, contudo, a mulher, enquanto o homem é o “dono do olhar” (p.444). Assim, a aparição de personagens femininas tende a esbarrar no impacto erótico, um meio claro de objetificação: quando a altiva Lígia coloca uma perna sobre a mesa e sobe o vestido, a visão de sua vagina, centralizada em primeiro plano, serve, claro, aos espectadores ficcionais, mas também aos reais. Faz-se interessante, então, a recorrência do corpo feminino nu no cinema de Cláudio Assis, bem mais constante que a nudez masculina. A padronização estética desses corpos é, igualmente, algo a ser questionado: a expressão da sexualidade feminina, sem pretensão sexista, não deveria ser plural? Outro ponto de inquietação, são os limites da representação cinematográfica do estupro. À guisa de parâmetro, o longa-metragem quebequense A Scream from Silence, dirigido, em 1979, por Anne Claire Poirier, discute essa questão com rigor intelectual e social. Há na obra dois núcleos narrativos com caráter metalinguístico: uma enfermeira, Suzanne, que é estuprada e precisa lidar com o trauma pós-violência; e duas outras personagens, a diretora e a editora desse filme dentro do filme, que assistem à sequência de violência sexual e conversam sobre as possibilidades de exibí-la sem intenção erótica ou estimulante. Objetivando driblar a fetichização do olhar patriarcal, o estupro de Suzanne é gravado pela perspectiva da vítima e, cena demorada, mostra sob uma luz horripilante o crime. A diretora observa: “Nenhum homem pode identificar-se com este estuprador, porque ele é repulsivo demais”. A editora, concorda: “Eles verão isso como algo que se lê no jornal… que aconteceu com outra pessoa, bem longe”. Pouco depois, no entanto, ambas duvidam de tamanha positividade e se questionam se há, de fato, qualquer real possibilidade de, ao mostrar cenas de assédio, esquivar-se inteiramente do voyeurismo cinematográfico. Em Baixio das Bestas, a violência sexual parece ser condição irrevogável das mulheres da região, pois que, a miséria, sempre contexto dos filmes de Assis, sentencia essas personagens à uma marginalidade dupla: pobre e mulher. Com efeito, a ideia é extremamente válida, mas sua reprodução é um tanto falha, aspecto perceptível, principalmente, no filme protagonizado por Auxiliadora. Sabe-se que parte da controvérsia ao redor dessa obra surge, de fato, de um conservadorismo ignorante: uma noção estereotipada do cinema brasileiro é que nele só há sexo e, com certeza, esse lugar-comum perseguiu a cinematografia de Assis. No Baixio, contudo, nunca se trata de relações sexuais e sim de violência e pedofilia — multiplica-se, logo, as responsabilidades. Decerto, o uso das câmeras sem proximidade, ou atenção aos detalhes dos corpos envolvidos nas cenas, é um recurso estratégico notável, mas, ainda, insatisfatório: quando Everardo (Matheus Nachtergaele) violenta a prostituta Dora (Hermila Guedes), observamos o episódio de cima — como o voyeur do famoso livro de Gay Talese, The Voyeur’s Motel (2016) —, o que não destitui a cena de erotização. Entretanto, o incômodo mais pungente dá-se, na verdade, com a imagem de Auxiliadora. A protagonista é, na ficção, uma criança e, não obstante, é a personagem que aparece desnuda com maior constância — o plot fundamenta essa frequência, mas não a isenta de ser problemática. Em certo ponto, Everardo olha diretamente para a câmera, acontecimento único, e diz que o melhor do cinema é, nele, poder fazer tudo o que quiser. Refere-se ao lugar-cinema, espaço abandonado da cidade, onde, seguidamente, estupra a prostituta Bela (Dira Paes), cena que vemos projetada na tela do local. Não é uma abstração tamanha, porém, cogitar, a partir desses dois momentos, uma reflexão tida pelos próprios produtores da película acerca da pretensa liberdade da narração cinematográfica: é, a valer, viável retratar qualquer coisa e, com ela, causar um efeito calculado? Ou, ainda, há limites no que é, e como é, representado no cinema? Invariavelmente, tais questionamentos são antigos e esquivos de ponto final. Cabe-nos, apenas, discuti-los. Thamara Amorin¹ é Graduanda em Comunicação Social - Produção Cultural e Mídias Sociais, na UFPE, Campus Agreste. Referências: HASKELL, Molly. From Reverence to Rape - The Treatment of Women in the Movies. The University of Chicago Press, Chicago, 3ª ed., 2016. MULVEY, LAURA. Prazer Visual e Cinema Narrativo. In: . In XAVIER, Ismail. (org.) A Experiência do Cinema. Col. Arte e Cultura, no 5. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1983.

  • Especial Azulão

    Especial comemorativo dos 80 anos do pequeno Grande. Há exatos 80 anos nascia o pernambucano Francisco Bezerra de Lima, o nosso Azulão, filho honorário de Caruaru. Dono de uma voz inconfundível, uma presença arrebatadora e um repertório que se confunde com a história de multidões, nosso mestre forrozeiro tem em seus 60 anos de carreira uma obra pulsante que é impossível separar das suas origens. Nela está impressa a originalidade de um artista que sempre soube dialogar com o novo e com as suas vontades e crenças. No último dia 17 de junho de 2022, Azulão decidiu se aposentar e sua Caruaru, já tão diferente do tempo de menino, foi o palco escolhido para essa despedida. Como agradecimento por sua grande contribuição para a cultura popular brasileira, a SPIA produziu um especial para comemorar junto com vocês o aniversário desse pequeno Grande. Muito obrigada, Mestre. Em “Azulão: 80 anos depois, o dia 25 de Junho deveria ser dia de festa”, Maria Clara Mendes e Joyce Noelly escrevem sobre a história e legado de Azulão, apresentando apontamentos pertinentes quando discutimos cultura no nosso país. Em “Três álbuns de Azulão”, Maria Clara Mendes e Mariana Gonçalves com auxílio do cantor, músico e colecionador de LPs de forró, Natan Lima, separam três álbuns de Azulão que manifestam e representam musicalmente uma discografia valiosa, repleta de clássicos, memórias e de personagens inesquecíveis. E por fim, em “Azulão por ele mesmo”, Maria Clara Mendes busca trazer um pouco de Azulão, através do que ele fala, canta e gesticula. Em suas palavras: “ninguém melhor do que Azulão para falar de si mesmo”. Um agradecimento especial a Natan Lima, a Luiz Ribeiro, a Azulinho e a Márcio Correia.

  • Azulão por ele mesmo

    Maria Clara Mendes Este vídeo ensaio busca trazer um pouco de Azulão, uma lenda viva da música brasileira, através do que ele fala, canta e gesticula. Como uma testemunha do seu próprio legado e da história do forró e de Caruaru, ninguém melhor do que Azulão para falar de si mesmo.

  • Três álbuns de Azulão

    Maria Clara Mendes e Mariana Gonçalves Um dos maiores nomes da música popular brasileira, referência pela sua voz e irreverência em cima dos palcos, Azulão representa a força de um artista predestinado a ser grande. Essa grandeza se manifesta musicalmente em uma discografia valiosa, repleta de clássicos, memórias e de personagens inesquecíveis. Com auxílio do cantor, músico e colecionador de LPs de forró, Natan Lima, separamos três álbuns de Azulão: ‘Eu Não Socorro Não’ (1975), ‘Azulão’ (1976) e ‘D. Tereza Arrependida’ (1992). Três álbuns lançados em momentos vitais da carreira de Azulão. Em continuidade ao especial em homenagem aos 80 anos do Mestre Azulão, convidamos todos a ouvir e a conhecer estes três álbuns: Eu Não Socorro Não (1975) Na década de 1970, Francisco Azulão já era uma figura conhecida por ter a sua voz em coletâneas, em um compacto duplo lançado em 1965, pela parceria com Camarão, além das inúmeras composições gravadas por gente importante como Marinês, Jacinto Silva, Messias Holanda, entre outros. Faltava um LP para chamar de seu e ele foi lançado em 1975 pelo Selo Esquema, agora com o nome artístico de Azulão. O Eu Não Socorro Não traz um repertório afiado com clássicos que ajudaram a pavimentar a carreira deste grande artista de Caruaru. Entre os sucessos se destacam: ‘Nega Buliçosa' (Thiago Duarte), ‘Mané Gostoso’ (Lídio Cavalcante e Adolfo da Modinha), e ‘Tropé de Cavalo’ (Abenildo Lucena e Genésio Guedes). Este LP também apresenta regravações de clássicos como ‘Severina Xique Xique’ (Genival Lacerda e João Gonçalves), ‘Esquenta Moreninha’ (Assisão), ‘Tem que ter Suor’ (Antônio Barros) e ‘Canção do Roedor’ (Cecéu) - gravada no mesmo ano pelos 3 do Nordeste. O disco tem o acompanhamento impecável do Conjunto Borborema, grupo que acompanhava Jackson do Pandeiro e que deu ao ‘Eu Não Socorro Não’ uma sonoridade fantástica. Azulão (1976) Depois de uma estreia impressionante com o clássico Eu Não Socorro Não, Azulão apresentou no ano seguinte, em 1976, uma verdadeira obra-prima. Se em seu primeiro LP a capa apresentava a figura ilustrada de dois personagens da música que dá nome ao disco, o segundo LP tem um jovem e elegante Azulão estampando na capa toda a sua magnitude. Este célebre LP se destaca por trazer músicas de compositores do agreste pernambucano como Genésio Guedes, Thiago Buarque, Brito Lucena, Juarez Santiago e Ivan Bulhões. A presença destes compositores evidencia que Azulão buscava não só cantar Caruaru, o objetivo era valorizar os artistas que nela existiam. Com um repertório alucinante do começo ao fim, é possível destacar os sucessos ‘Dona Tereza’ (Elias Soares), ‘Caruaru do Passado’ (José Pereira), ‘A Blusa Dela’ (F. Azulão e Ivan Bulhões), ‘Apanhadeira de Café’ (F. Azulão e Brito Lucena), ‘Amor tenho para lhe dar’ (F. Azulão, João da Condil e Sebastião Porfírio), e ‘Barra dos Coqueiros’ (Genésio Guedes, F. Azulão e Djalma da Hi-Hi). Podemos considerar que este é o primeiro LP de Azulão composto em sua maioria por músicas inéditas, sendo todas as músicas relevantes e conhecidas do público. Este disco mantém o mesmo nível do anterior na sonoridade, tendo novamente o acompanhamento do Conjunto Borborema. D. Tereza Arrependida (1992) Dez anos separam o último LP de Azulão, na gravadora Copacabana, do importantíssimo D. Tereza Arrependida, lançado de forma independente pela gravadora Ed Som. Segundo consta na contracapa, Azulão foi esquecido pelas gravadoras e ficou sem contrato, tendo que produzir por conta própria. Em 1992, em um novo trabalho independente, a resposta não poderia ser mais enfática para quem duvidava do Pequeno Grande: mais um LP de sucesso. O grande clássico deste álbum é ‘Afogando a minha dor’ (João Caetano), música obrigatória no repertório de muitos artistas caruaruenses. ‘O invocado’ (Luiz Moreno) traduz a versatilidade de Azulão em gravar uma música estilo rock. Também merecem destaques: ‘D. Tereza Arrependida’ (Biro Miranda e Azulão), ‘Coração sofredor’ (Gilvan Neves) e ‘Forró Chorão’ (Camarão). Este LP traz um Azulão alinhado com o que era produzido na época no que se refere ao forró e a música nordestina. A importância do LP D. Tereza Arrependida se encontra no retorno das vendas de Azulão com o que ele sabe fazer de melhor: cantar. Um agradecimento especial a Natan Lima. Destaque para algumas composições assinadas por Azulão Olhei o meu amor (Francisco Azulão - Camarão) Gravado por Azulão LP: Forró de Zé do Gato - 1965 Disponível: https://youtu.be/NpstmXxCrGI Ajuda-me (Francisco Azulão - Brito Lucena) Gravado por: Azulão Compacto duplo: Francisco Azulão - 1965 Disponível em: https://youtu.be/MxbQPzWdZOw Pé de Jatobá (Francisco Azulão - Jacinto Silva) Gravado por: Marinês e Sua Gente LP: As Melhores do Nordeste - 1969 Disponível no YouTube: https://youtu.be/IcY6wI-KZlM Sabiá na Bananeira (Paulo Duarte - Francisco Azulão) Gravado por: Messias Holanda LP: O Fino da Roça - 1969 Disponível em: https://youtu.be/ASq4OhPp7TQ Esperei na Fogueira (Francisco Azulão - Elias Soares) Gravado por: Marinês LP: Pau de Sebo Vol.5 - 1971 Disponível em: https://youtu.be/LydJxD7C008 Linda Menina Gravado por: Jacinto Silva LP: Pau de Sebo Vol.6 - 1972 Disponível em: https://youtu.be/zkPJtRgRLD4

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